Crônicas

sexta-feira, 26 de julho de 2013

Esboços ensaiados



Dez meses sem uma gripe. Dez meses sem sequer um resfriado. A prevenção é sem dúvida a melhor forma para evitar a reabilitação...

... E por falar em prevenção...

Entretanto, uma outra forma biológica de bactéria invadiu meu sistema imunológico e os sintomas se colidem dentro de dois mundos distintos: O mundo real e o mundo ideal.

O ser humano possui a intrépida mania de dar título a tudo, aqui, eu chamaria de “esboço”.

Um esboço é a aquisição inicial de um formato, uma vida que se inicia na arte de um pincel, na concepção de uma crônica repassada para os dedos, no choro mútuo de uma reconciliação...

Quem analisa uma obra prima e entende que ela ainda permanece inacabada contempla a arte em tudo que vê porque a vida é uma plena continuação de outra história que precisa ser redigida, dando vazão às outras oportunidades.

Tempos atrás tinha o hábito de sabotar meus esboços. Quando via que um esboço já estava praticamente enfatizado em sua total forma de concretização (coloração/ imagem/moldura) eu simplesmente vinha com uma borracha e apagava tudo.

Rompimentos que desafiavam a lógica e a compreensão. Mas vem cá: Admiração e contemplação possuem lógica?

A arte deve ser vista como um desenho de uma criança: com ternura, sobriedade e sensibilidade.

A arte só se conjectura como arte quando ela é contemplada, sem castrações analíticas e sem solicitações. Assim como o amor, quando você pede pra ser admirado, deixa de ser uma admiração.

Hoje, alguns meses depois, este esboço adquiriu uma forma divinamente bela, virtuosa e esplêndida em cada centímetro, em cada ranhura, em cada dobrinha não permitida a olho nu.

Por isso a criação é tão brilhante: A arte passa despercebida sem a percepção de um olhar atento, de um olhar curioso e interessado, por isso muitos não apreciam uma sinfonia, simplesmente porque não possuem a apuração para separar todos os seus acordes.

O meu esboço se transformou em arte, uma arte que não permite estante, não permite pregos nem o ofício de uma parede branca...

A minha arte é viva, ambulante, discordante, compassiva, harmônica e possui um olhar que me faz enxergar toda a arte que nela habita...

... E como todo mundo adora dar nomes pra tudo que vê, a minha arte já tem um nome; com algumas letras divididas em vogais consoantes e significados que a cada dia oferecem novos panoramas...


Faça a sua arte você também; amplifique, permita-se, disponha-se, desmistifique-se. A imaginação é a nossa realidade mais profunda. 

quinta-feira, 25 de julho de 2013

A espreita de uma espera




"Que eu queria poder te dizer sem palavras.

Eu queria poder te cantar sem canções.

Eu queria viver morrendo em sua teia.

Seu sangue correndo em minha veia.

Seu cheiro morando em meus pulmões.

Cada dia que passo sem sua presença.

Sou um presidário cumprindo sentença.

Sou um velho diário perdido na areia.

Esperando que você me leia.

Sou pista vazia esperando aviões."


Vander Lee

segunda-feira, 22 de julho de 2013

Vivendo sem Tulipas



Gostar de Tulipas não é fácil. É conviver obrigatoriamente com uma relação fadada as idas e vindas, ao manejo da sensibilidade, a percepção da tradução dos sinais e principalmente a sagacidade do “saber tratar”.

É aprender a viver sem as pessoas que vivem sem você... Complexo!

Assim como uma conquista, existe toda uma cadeia de mimos e afagos para fazer com que as idas e vindas não se transformem somente nas idas. Natural de qualquer relação em que haja afeto. Em análise primitiva; deve ser contemplativa para ambas as partes. Certo?

Errado!

Para a Tulipa não é bem por aí... Sol moderado, vento moderado, umidade moderada, alimentação super cuidadosa... E tudo isso só para ela encantar o seu ambiente com a sua luxuosidade, o seu refinamento e a sua pose, simples assim.

E se você destratá-la, ela não reclamará! Seu silêncio é a penitência cruel e indagadora da sua consciência. Ela é movida por atitudes; destratou ela murcha, prática e sem rodeios.

Entretanto, se imaginarmos que para todo esforço, existe um merecimento, podemos nos comprazer da sua simbologia calcada pela antiguidade: Amor eterno, amor perfeito, amor irresistível. Um tenro consolo motivacional para seus adoradores.

Mesmo sobrevivendo diariamente debaixo de um teto de vidro, ter uma Tulipa em casa é conhecer e se desconhecer todos os dias; é embrulhar e desembrulhar desvendando uma novidade a cada dia. A durabilidade depende da dedicação.

Um capricho necessário à vida dos que a contemplam sem precisar verbalizar, simplesmente sentir, prosseguir e preparar um novo plantio para que a ida seja precedida pela vinda, vivendo sem Tulipas.

sexta-feira, 12 de julho de 2013

Cordialidade inóspita


Algumas histórias se reparticionam em vários episódios, como se fossem capítulos dentro de um único seriado e ainda na mesma vida... Outras possuem uma continuidade que ultrapassa outras vidas, ás vezes nascem na mesma época, ás vezes se desencontram na erraticidade...

Pois bem.

Com exceção da era Paleolítica, onde os homens não faziam janelas em suas cavernas, a humanidade desde que descobriu a necessidade de se relacionar, sempre teve duas lendárias escolhas de interesse mais sério: Janela ou porta.

Após uma bem sucedida aproximação, o desejo de ir além acontece naturalmente e você busca amplificar essas condições, seja à espera paciente de um convite (entrando pela porta da frente), ou burlando os protocolos e nutrindo sua ansiedade pela alternativa mais rápida: a janela.

Tome nota: Não existem relacionamentos que começam pela porta dos fundos, você está no canal errado.

Analise:

Entrar pela porta necessita de conquista e de aceitação; tem todo um aparato envolvendo este cenário: paciência, criatividade, gentilezas, respeito, confiança e acima de qualquer coisa: credibilidade.

Pela janela: Existe algo que cativa nesta ação. Mesmo não sendo adequada, ela possui elementos que incitam e aguçam a nossa curiosidade. Nos indagamos sobre esta audácia, porém, dado as primeiras impressões, deixamos rolar...

Aparentemente você não viu nada inapropriado nessas duas opções, correto?

O equívoco está no sujeito que pratica as opções.

Muitos se acostumam a entrar pela janela e se esquecem que a porta seria - em tese - a forma mais educada e eloquente de se entrar na vida de alguém.

O sujeito se transforma num invasor de residências e impreterivelmente será confundido por um ladrão, dado sua expertise em arrombar janelas... Sua vida se torna uma verdadeira aventura e com a prática, logo mais estará pulando muros, atravessando cercas, fazendo coisas que nem o homem aranha seria capaz... Um autêntico praticante do “Le Parkour”.

É fato dizer que muitos renunciam a opção convidativa da porta por conta da indecisão da dona da casa. O sujeito até possui uma inclinação caseira, mas, em detrimento das incertezas, opta pelo trajeto mais fácil.

A porta nos rende uma certa tranquilidade, mesmo sabendo que não existe nenhuma quietude numa relação, ser convidado nos transmite uma real sensação de certeza... Basta fazermos nossa parte na manutenção de futuros convites.

O papel de quem entra pela janela é de resistência e o adeus é sempre uma falsa mentira.

Não se pode acreditar em términos, nem desconfiar das rupturas. Quem entra pela janela acredita nas metáforas e não leva a sério todas as palavras. Ele prefere terminar com ele mesmo e sair pela porta ao invés de terminar com ela e sair pela janela.

Quem entrou pela sua vida por meio de uma janela raramente desiste porque ele impôs um cuidado demorado nesta ação. Foi tudo planejado, embora para você parecesse uma surpresa.

Ele teve todo cuidado de não pisar no rabo do gato e te acordar no meio da noite com um susto. Ele entrou de mansinho sem acender a luz e teve que tatear toda essa manobra no escuro.

Cá entre nós:

Se o invasor estiver mesmo interessado, ele pode aparecer no centro do seu quarto com um lindo buquê e beijar o dorso da sua mão com um olhar de “oops, desculpe a invasão”.

Mesmo não havendo uma relação, tudo é relativo.

segunda-feira, 8 de julho de 2013

Denunciando sombras



Pertencemos a um mundo provisório, no entanto nos apegamos de uma forma tão fixa as nossas paixões que chega a ser paradoxal.

Os velhos saem de cena. Os novos surgem...  As transformações se alternam, tudo se oxigena e tudo, absolutamente tudo fica para trás...

Os pertences que te pertencem nessa vida não te pertencem. É fugaz, efêmero e fazem parte de um processo gradual, nada mais.

Então o que nos pertence? O que podemos tomar como posse? Do que podemos nos apropriar?
A desarmonia lhe pertence. Os desacordos. Tua superação. Tua determinação.

A sua vontade de atender somente as suas necessidades pessoais lhe afasta de qualquer possibilidade real de felicidade... E a felicidade não é um estado estacionário, ela é inquieta feito uma criança de 6 anos, a diferença é que você possui a manobra de chantagear uma criança e com a felicidade não se barganha nada... Mas podemos regularizá-la e prolongar o seu estado de torpor.

Como você reagiria diante de você mesmo? Já tomou contato com os teus sentimentos, sem pieguismo e sem narcisismo?

Como você identifica a sua insegurança?

Nossas defesas nos traem constantemente e - por vezes - nem detectamos o ato porque ele já se automatizou dentro de nós. Justificativas pra deixar de fazer isso ou aquilo, fazem parte da nossa trilha sonora e do nosso script, haja vista, é tão confortável cultivar os antigos costumes e hábitos, não é mesmo?

A própria frase “se tiver que ser, será” já nos denota algo preguiçoso, sem esforço, a mercê de uma roupagem ilusória e dependente... Os céticos adotam esta frase no afã de uma decepção, já os espíritas ou mais disciplinados adotam isso (alguns) em suas expiações, provas, programação encarnatória ou do próprio Deus... Certo? Errado!

Perdemos os parâmetros! Estamos projetando novos tormentos.

Como você reagiria diante de você mesmo? Já se convidou a se conhecer melhor? Sair mais vezes com você mesmo (sem ninguém de vela, principalmente o “Sr Ego”)?

Já se abraçou hoje?
Existe um orador aí, bem dentro de você, louco pra que você assista algumas palestras sobre ele... Que tal ouvi-lo sem sentimentalismos ou vitimismos?

Somos hábeis na arte de nos enganarmos!

A discrepância está aí: Ouvimos, automatizamos o que ouvimos e fazemos uma triagem somente do que nos interessa, autojulgamento.

E assim sendo, que baita roteiro construímos com o abstrato não é mesmo? Será que estamos construindo uma peça teatral para nós ou para a aceitação de outras pessoas?

À medida que nos conhecemos, trabalhamos nossos pontos fracos e notamos pequenos, porém importantes, fragmentos dessas mudanças.

A buzina passa a ser um mero acessório diante do caos da nossa cidade. Você não terceiriza mais as decepções. As emoções se afloram sob medida; nem a conta gotas, muito menos com alagamento.
É tão salubre olhar para trás e ver como agíamos em determinadas circunstâncias, chega a ser engraçado... E exagerado, por vezes.

Sejamos pacientes com as nossas imperfeições, elas serão a base para a nossa mudança posterior.

sexta-feira, 5 de julho de 2013

Drenando culpas



A linguagem universal possui méritos incontestáveis e sua força – quando exercida – transpõe os mais sólidos obstáculos.


Conseguimos enxergar o amor até mesmo nas dicotomias das almas evolutivas da história; Einstein criou a teoria da relatividade baseada no amor, embora tenha brilhado como aluno, teve uma vida solitária e de contingência amorosa...

Thomas Edison se justificou ao desvendar o filamento que faltava para a descoberta da lâmpada: “A melhor forma para criar algo é tentar e errar quantas vezes for necessário”

Podemos resumir que tentativas geram erros que criam intersecções de perseverança e persistência. Quando untamos na mesma frase as palavras “tentativa”, “erro”, “perseverança” e “persistência” não estamos falando dos subprodutos de uma relação? E relação não é a simbologia física e espiritual do amor?

Mas a força onipresente do amor também possui seu ponto fraco (o único talvez) capaz de bagunçar e chacoalhar toda sua linha ilógica e irracional:

A culpa.

A culpa exerce o dom exclusivo de criar um elo entre a racionalidade e a passionalidade, coisa que o amor está longe de aprender.

A culpa é um sentimento racional. Quanto mais nos vinculamos a sociedade e aos seus protocolos, mais perturbações desenvolvemos dentro de nós, somando nossas falhas a nossa personalidade, nutrindo dúvidas, angústias, confusões, cobranças e noites de insônia.

A punição é o produto da culpa, mas será que o amor se sente culpado em não estabelecer este elo entre a paixão e a razão? Ele não, mas o seu “prestador” sim.

O amor é uma matéria prima e nós somos os prestadores de serviço dele. Passamos a vida em busca de um amor em todas as esferas. Como somos meros prestadores desse serviço, alguns fazem de tudo para vender a ideia, e outros tantos se esbarram nos acúmulos impertinentes da culpa.

Quem vende a ideia já está se auto obsidiando porque o amor, embora seja uma matéria prima, não se permite às comercializações.

Já os que se interpelam pela culpa, precisam de sensibilidade para identificar estas punições.

Você já refletiu por alguns dias sobre “aonde, como, porque” você se sente culpado?

Desistiu nas primeiras horas? Claro! Ninguém identifica as próprias culpas porque são tantos subprodutos que ela gera que fica impossível clarear essa camada espessa de insatisfações.

O padrão de funcionamento possui um comportamento linear, muitas vezes visível somente para quem está do lado de fora, convivendo com você.

Culpas de outras vidas que nós não lembramos, mas que se alojam em nosso inconsciente. Culpas causadas por obsessores que se aproveitam da nossa fragilidade, enfim... Nos punimos de diversas formas porque ainda somos infantis em nossa jornada.

Ao mesmo tempo que queremos, nos impedimos, ao mesmo tempo que precisamos, nos opomos, ao mesmo tempo em que queremos afeto, recusamos, e nesse “concurso íntimo” nos tornamos obsessores de nós mesmos.

Vencer o orgulho e entrar em contato com o seu sofrimento é a forma mais eficaz de tangenciar seus medos e identificar reações ou ações que não faziam parte do seu repertório comportamental.

Quando permitimos este enfrentamento, nosso nível de consciência se eleva, nossa relação com a culpa se torna indiferente, pois perdemos o medo de suas imposições e com isso nos propomos a restaurar essa desarmonia interior.

A tarefa é árdua, processual, gradual, mas não estamos sós nessa batalha, basta acreditar em nossa imortalidade e em nossos propósitos que o sofrimento se atenua e a frustração deixa de protagonizar a sua vida.