Crônicas

domingo, 11 de agosto de 2013

Inventando saudades


Do pouco que me recordo da minha infância, lembro-me que debochava copiosamente das pessoas que admiravam estranhos... Tirava sarro e pensava comigo mesmo: “Que ridículo chorar por causa de um ídolo”.

A criança vive de simbologias, mas quando essas figuras saem de cena, damos importância a uma realidade nada virtual...

A saudade inventa e revigora o nosso ímpeto de enxergar um ponto além do horizonte... Um ponto que mesmo distante, buscamos incessantemente chegar até ele em corpo físico...

E depois notamos que após a chegada a este ponto, temos mais um adiante, numa espécie de “esconde esconde”... E brincamos de “pega pega” até o fim dos nossos dias, em uma longa e extenuante caminhada...

Toda perda é imprevisível, mas ela nos aponta para valores indescritíveis que estavam adormecidos dentro de nós, descobre-se o que não é mais, o que não será, mas revela-se o que está por se eternizar: A saudade.

Não é fácil enxergar o que não se pode enxergar mais com os nossos olhos materiais. A nossa fotografia mental é o melhor recurso para nos aproximarmos dessa vontade incontida e pressentirmos um contentamento intangível, porém real.

Restam as canções. Por detrás da ausência, sobra um alívio ofertado por uma trilha sonora que ouvíamos juntos, ele – ao volante – eu, descobrindo a estrada...

E que estrada! Não se permitia buracos, oscilações bruscas, muito menos invariáveis mudanças climáticas, era sol o tempo todo.

Quando surgia alguma manobra mais grosseira, ele tratava de me acalmar em uma espécie de recapeamento, o que hoje traduzo como “a chance de recomeçar”.

Temos muita dificuldade em aceitar um abandono repentino, uma perda imprevisível, talvez seja por isso que muitos renunciam o fracasso dos laços e evitam a recordação, o que acredito ser um suicídio indireto. É tão desumano escamotear uma despedida.

Por isso elevemos a nossa sabedoria e sensibilidade à forma mais poderosa de sobreviver depois que inventaram o amor; a lembrança.

Hoje, entendo perfeitamente as lágrimas que escorrem ao trazê-lo em minha memória. Hoje entendo perfeitamente porque as pessoas choram quando um ídolo se vai, por isso invento saudades.

Te julgo imortal em minhas lembranças e as transformo num porto seguro. Esta é a maneira mais anestésica que encontrei para suportar o sofrimento causado pela ausência. Assim convivo amistosamente com o meu luto interior, na certeza de que em breve nos encontraremos novamente para curtir mais uma estrada juntos...

Valorizem o Dia dos Pais, pois somente quem passa este dia sem o seu principal protagonista, sabe que o espetáculo passa batido e sem aplausos.

Aproveitem essa estrada como se não houvesse o amanhã.

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