Crônicas

terça-feira, 19 de agosto de 2014

Basta!


Existe uma fase da vida que a gente deixa de ser aquela silhueta projetada em pessoas para virarmos realidade. É o momento de evitar o sofrimento do calendário, imaginando as razões que te levaram a não estar mais com o passado.

É o rompimento do cordão umbilical com certas satisfações que você tem que dar a certos compromissos, uma espécie de queda livre de um Bungee Jump (sem corda), sentindo o vento na cara.

É a fase do namoro consigo mesmo, de se olhar no espelho e se orgulhar do que é, ou encarar os defeitos, apontar as fobias, sentimentais (ou não) e seguir adiante sem ter que mudar por conta de algo ou alguém.

É sentir uma saudade nostálgica num sábado à noite. É se indagar sobre o que nos leva a ficar lendo um livro num sábado à noite ou libertar a imaginação ao pensar em nossa jornada até aqui... Num sábado à noite.

Sem arrependimentos. Sem ressentimentos. Sem boicote. Sem sabotagem. A gente se convida a participar da nossa vida.

Para muitos isso se rotularia em desapego, para mim, reconstrução individual.

O desapego não é a chave da felicidade, aliás, não existe chave para isso ou para aquilo, as pessoas atribuem a esperança pela felicidade, como sendo um sentido primordial de vivência, de barganha, de escambo e, quando as coisas não vão bem, fogem da realidade sem tomar contato com a mesma.

E como fogem dessa vida? Procurando outra vida. Esse é o grande equívoco que cometem; repassar a nossa vida para uma outra administrar; projeções, expectativas, devoção, entrega, álbuns precoces no Facebook. Divulgamos o pretenso relacionamento como se estivéssemos vendendo uma ideia de exato, de correto, de bem maior.

Viemos com a ideia de que pra ser feliz é preciso ter alguém para preencher tudo que está repleto de vazio dentro de nós, repassamos a nossa sombra adiante e esquecemos que essa encarnação é única, intransponível e valiosa demais para arrendarmos para outrem.

O fato é que todos nós (implacavelmente) já servimos e já fizemos alguém de muleta emocional; ninguém escapa de um discurso bem arquitetado, ou de uma persuasão egoísta bem camuflada. É por isso que a frase de Oscar Wilde nos afugenta tão bem: “Pouca sinceridade é uma coisa perigosa, muita sinceridade é absolutamente fatal.”

Revogo-me ao direito de ter um período sabático e entender que ausentar-se do valor inestimável que é fazer alguém feliz é temporário, como estar triste ou estar alegre.

Enfim, estar só é correr riscos, mas nos convidar ao autoconhecimento é algo digno de um apaixonado pela vida, pela própria vida.

O apaixonado jamais adia o encontro, e eu precisei me atrasar para entender isso.

Nenhum comentário:

Postar um comentário